MPB Hoje - maio de 2004.

O amarelo infinito das rosas
de Consuelo de Paula


O novo CD da cantora e compositora mineira Consuelo de Paula é belíssimo, como todos os outros. O violão de nylon e a percussão voltam acompanhados por cordas de aço, flautas, clarinete e violoncelo. Uma sonoridade pura em canções puras. Simples e sofisticado, "Dança das Rosas" foi lançado em show igualmente emocionante, em São Paulo. Leia mais sobre o espetáculo.

A imagem que vem à cabeça é a da rosa. Da rosa amarela banhada por sol, alimentada de água, guerreira nos ventos. A rainha de terras argilosas. A mais fascinante dentre as centenas de espécies de rosas.

Mas quem está no palco é Consuelo de Paula, carregando na alma a mesma sinceridade dos olhos de menina, com os quais via um Brasil de fanfarra, congada e carnaval passar em frente à janela de casa, em Pratápolis.

A mesma sinceridade da adolescente curiosa que, nos intervalos da faculdade de Farmácia, em Ouro Preto, garimpava com os amigos atrás de samba, seresta e baião.

Descortinado, o altar outrora erudito do Theatro Municipal abriga o desfile triunfal de canções populares, prenunciado por um "Canto de Guerra". "Eu já mandei pro céu / com arma de ferro / uma branca flor / a rosa que avoou / de um verso popular", avisa Consuelo.

Que ninguém reclame, portanto, nem que finja surpresa ao ser fulminado pelas pétalas cortantes de "Dança para um poema", abre-alas de um disco "impressionantemente comunicativo", último bloco de uma trilogia generosa até em sua própria adjetivação -- porque os três CDs são um só, ganham todos a alcunha de "obra-prima".

Todas as canções fluem como substâncias da água densa e dura de um rio calmo, que delineia com segurança e excelência o seu próprio caminho. No show, a referência de cada criação é dispensável. Os sons de "Samba, Seresta & Baião", "Tambor & Flor" e "Dança das Rosas" são, de tão complementares, indivisíveis.

Por isso soam orgânicas as parcerias frescas de Consuelo com Rubens Nogueira e Etel Frota. Pétalas de uma só flor; rosas da mesma roseira. Elementos mágicos, com muitas (e múltiplas) simbologias, de um passado que sobrevive até na cor esverdeada da esperança futura.

Consuelo olha para suas raízes como a camponesa trabalhadora que volta para casa no final do dia. Sob o sol poente, que se alaranja, recolhe do varal as roupas que deixara secando e escolhe sempre a melhor para esperar o dia seguinte. Não se apressa porque sabe que enriquece a cada amanhecer e que o futuro é feito de acúmulos.

Perdido o tempo, o trem, contados os anos, constrói-se um caminho que cada passo pinta de amarelo, como um quadro em movimento. Na tela, alamandas, chuvas-de-ouro, biris e orquídeas tecem tapetes que conduzem às rosas.

Pronta, a pintura brilha. Como Consuelo de Paula brilha. Exultante, exuberante, íntegra e plena, subvertendo até mesmo a ordem própria da Natureza. Faz do sol um mero girassol, agora definitivamente condenado à adoração. Encantado, o astro se rende à artista, coreógrafa das contra-danças de "Dança das Rosas". (R.S.)

Ricardo Santhiago, para o MPB HOJE

Dança das Rosas
Independente/2004

À venda nas melhores lojas
ou através do site www.consuelodepaula.com.br